quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O mundo, a arte e eu



Sou um sujeito tardio. Demorei para andar. Demorei para falar. Demorei para ler, e mais ainda para escrever. Também no amor fui iniciado tardiamente. Lembro-me de que, enquanto os garotos da minha idade já andavam acompanhados e às escondidas, eu brincava ingenuamente com meus “comandos em ação”. Para fazer jus à minha lerdeza, também no mundo das artes minha iniciação foi tardia. Já era adulto quando fui pela primeira vez a uma galeria de artes. E, claro, pouco pude compreender do que se passava ali.
Mas aconteceu um fato curioso. Não demorei nadinha para desviar o olhar dos quadros dependurados e começar a observar o comportamento das pessoas ali. Percebi que havia pessoas que realmente admiravam aquelas figuras disformes, traços aleatórios e desenhos quase infantis. Mas havia também grupos de estudantes – alguns acompanhados de seus professores e outros apenas atônitos, olhando em torno, como quem não vê sentido naquelas imagens.
Um comportamento em particular me chamou a atenção. Os estudantes não olhavam exatamente para as obras. Antes, sua atenção se dividia entre a placa que identificava o autor da obra e seu caderninho de anotações, ávidos que estavam de exibir em sala de aula uma galeria de nomes ilustres. Cá com meus botões, duvido que alguém seja capaz de, com apenas um lance de olhar, guardar na memória a imagem, o nome do artista, o título da obra e o século de sua produção. Por isso disse que nos cadernos havia apenas nomes.
A minha inquietação só crescia. Tentei pegar no ar algumas migalhas de explicação. De um professor, que por dever de ofício explicava a exposição a seus alunos, ouvi falar de “influências clássicas”. Noutro corredor, uma mulher de sotaque francês falava com suas companheiras algo a respeito de “arte conceitual”. Lembro-me também de ouvir coisas como “vanguarda”, “denúncia da hipocrisia burguesa” e “deformidade do mundo moderno”.
Desisti. Desisti de entender o que estavam falando. Desisti de entender o que estava vendo. Desisti de entender o comportamento dos estudantes. Apenas sentei-me relaxadamente e li o folder da exposição distribuído na entrada. Ao abandonar o folder, um dos quadros me chamou para perto de si. Não é que eu quisesse olhar para ele; ele é que me chamou. Tratava-se da imagem de um homem, sozinho, sentado no topo de uma montanha, próximo a uma queda d’água. Era um cenário triste e imponente. Enquanto eu olhava, o quadro ia me dizendo:
– Está vendo a sua real condição? Está vendo a sua pequenez? Está vendo sua limitação? Pouco importa onde você está. Você sempre estará sozinho num mundo hostil. Você pode até fingir que se sente seguro, mas a sua condição é essa, a mais absoluta solidão.
Perplexo com o que ouvi, saí rapidamente e fui embora. E sequer anotei o que ia na placa ao lado do quadro. Ainda penso em voltar lá. Talvez os outros quadros também queiram me dizer alguma coisa. Seja como for, o que ouvi foi suficiente para saber que os quadros têm muito a dizer sobre nós. Mas é necessário entender a língua deles.
Onde se aprende isso?

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