sábado, 22 de março de 2014

Dois mestres, um ideal: esforços de filosofia construtiva


MÁRIO 
Pretendia despertar no aluno o espírito criador, evitando prender-se a ideias pré-concebidas e a sistemas fechados: “... toda a minha luta como professor foi despertar nos alunos a sua capacidade criadora. Não quero dizer que eu tenha conseguido; não, não consegui, malogrei. Mas não fui eu que malogrei, foram meus discípulos que malograram, que se deixaram envolver pelo espírito quantitativista, pelo espírito da autoridade. Assustam-se com as autoridades e então ficam subservientes a um determinado pensamento, preferem estar no coro a representar os primeiros papéis. Mas o próprio Aristóteles dizia isto, aliás uma bonita expressão dele: “nós devemos ser como aqueles que querem representar os primeiros papéis e não no coro.” (Naiejda Santos Nunes Galvão e Yolanda Lhullier dos Santos. In: Monografia sobre Mário Ferreira dos Santos)

NOICA
Mas, para além de todos os exercícios técnicos (cuja importância é difícil de ser apreendida por quem não tenha uma noção exata da pobreza do contexto), a pedagogia de Noica era uma forma de treinar o espírito para a atividade cultural, desencorajada pela pobreza das condições de vida e de trabalho oferecidas pela sociedade comunista. “Descobrireis que os limites interiores são mais difíceis de transpor do que os exteriores” – era uma de suas fórmulas favoritas. Ou “Não presteis atenção às circunstâncias imediatas. Considerai a história pura meteorologia: não mudeis vosso destino e vossas ideias dependendo do clima. A história precisa de cavalos. Peço-vos que sejais cavalos de corrida”. (Andrei Plesu, sobre Constantin Noica. In: Vida intelectual sob a ditadura)

MÁRIO
Quando viajei pela Europa e vi a grandeza daqueles povos, lembrando-me das coisas do meu país eu tinha pena de nós, como éramos tão atrasados e só pensava em voltar para o Brasil e lutar nesta terra, para que nós fizéssemos o que eles faziam.... (Mário Ferreira dos Santos, ao voltar de viagem à Europa)

NOICA
Prefiro viver num país onde tudo ainda está por fazer a viver num país em que as grandes aventuras do espírito já foram realizadas. O que eu faria se fosse para a Europa Ocidental? Não encontraria nenhum espaço a menos que dirigisse minha atenção a algum obscuro comentador de Aristóteles, a algum texto apócrifo, a algum fragmento incerto. Aqui posso tranquilamente ocupar-me com o próprio Aristóteles. O tempo do “alexandrinismo” ainda está distante. Regozijemo-nos no frescor do “arcaico” e não esqueçamos – sob a influência de uma deficiência real – a experiência privilegiada do possível. (Em resposta a Andrei Plesu, quando este lhe perguntou por que não foi para o exílio na Europa Ocidental)

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